Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

quinta-feira, 12 de abril de 2018

Molly Peacock - Por que não sou budista ‎

A poetisa norte-americana dialoga com as ideias veiculadas pelos preceitos budistas, em especial sobre o fato de que não devemos nos apegar demais às coisas, pois o desejo arraigado seria a fonte de todo o sofrimento, visto que jamais nos sentiremos plenamente saciados, e, de desejo em desejo, a alma poderá vir a aportar, sem o querer, no reino da frustração.

Peacock bem percebe que os desejos não se encontram num mesmo plano de equivalência, senão que apresentam níveis de precedência. Assim, o alcance da redenção divina não se pode equipar ao desejo mundano de se adquirir um novo traje da última moda.

Por outra via, é claro, os ensinamentos de Buda parecem expressar à perfeição o que ocorre com certos indivíduos que por mais que tenham, por muito mais anelam no plano material – deixando à míngua qualquer pretensão de evolução espiritual, mesmo porque são incapazes de exibir sentimentos de compaixão pelo próximo.

J.A.R. – H.C.

Molly Peacock
(n. 1947)

Why I am not a buddhist

I love desire, the state of want and thought
of how to get; building a kingdom in a soul
requires desire. I love the things I’ve sought –
you in your beltless bathrobe, tongues of cash that loll
from my billfold – and love what I want: clothes,
houses, redemption. Can a new mauve suit
equal God? Oh no, desire is ranked. To lose
a loved pen is not like losing faith. Acute
desire for nut gateau is driven out by death,
but the cake on its plate has meaning,
even when love is endangered and nothing matters.
For my mother, health; for my sister, bereft,
wholeness. But why is desire suffering?
Because want leaves a world in tatters?
How else but in tatters should a world be?
A columned porch set high above a lake.
Here, take my money. A loved face in agony,
the spirit gone. Here, use my rags of love.

Buda Reclinado
(Yuliya Glavnaya: artista russa)

Por que não sou budista

Amo o desejo, o estado de necessidade e a ideia
de como conseguir; construir o reino numa alma
requer o desejo. Amo as coisas que busquei –
você em seu roupão de banho não cintado, as línguas
de dinheiro que pendem
de minha carteira – e amo o que me apetece: roupas,
casas, redenção. Acaso um novo traje cor de malva
iguala-se a Deus? Oh, não, o desejo é categorizado.
Perder uma caneta dileta não é como perder a fé.
O desejo agudo por um bolo de nozes é afastado
pela morte,
contudo o bolo em seu prato tem um significado,
ainda quando o amor periga e já nada importa.
Para minha mãe, saúde; para minha irmã, despojada,
integridade. Mas por que o desejo é sofrimento?
Por que o apego deixa o mundo em farrapos?
De que outra forma deveria estar o mundo senão
em farrapos?
Um pórtico com colunas a um nível mais elevado
que um lago.
Olhe, sirva-se do meu dinheiro. Um rosto amado
em agonia,
o espírito que se foi. Tome, use os meus trapos de amor.

Referência:

PEACOCK, Molly. Why I am not a buddhist. In: GWYNN, R. S.; LINDNER, April (Eds.). Contemporary american poetry. 1. ed. New York, NY: Longman, 2004. p. 345. (“Penguin Academics Series”)

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