Alpes Literários

Alpes Literários

Subtítulo

UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

segunda-feira, 12 de fevereiro de 2018

Roberto Malvezzi - Três Plágios de Brecht

Aos artistas que têm identidade com o sofrimento do povo – portanto, não exatamente aos da espécie “coxinha” (rs) –, prestamos homenagem por meio desta postagem, dividida em três poemas ao estilo da poesia engajada do alemão Bertolt Brecht, acompanhados por imagens de telas do pintor de Brodowski (SP), Cândido Portinari.

O autor, também músico, reside em Juazeiro-BA e atua na Comissão Pastoral da Terra do São Francisco: observa-se, por tal descritivo, o seu compromisso com o trabalho de conscientização política, conexo à missão diocesano-religiosa. Havendo interesse em conhecê-lo melhor, internauta, você poderá navegar pelo próprio endereço eletrônico criado por Malvezzi na internet.

J.A.R. – H.C.

Roberto Malvezzi
(n. 1953)

Meu I Plágio de Brecht

Enquanto eu era gestado,
meu pai trabalhava no campo e
minha mãe rezava uma ave-maria.
Quando cresci, fui-me embora pelo mundo.
A ligação uterina da transcendência e
da terra, porém, ficará comigo até o
fim de meus dias.

O Lavrador de Café

Meu II Plágio de Brecht

Não havia marujos cansados nas
caravelas de Cabral quando o Brasil
foi descoberto?
Se Tiradentes condensou em si a revolta
dos dominados, por que é o mártir dos
dominantes?
Por acaso Juscelino carregou nos ombros
o concreto para o palácio da Alvorada?
Não consta que os frontispícios de
Brasília contenham o suor de Niemeyer...
Os candangos ergueram Brasília: onde está
sua representação no Congresso?
As estruturas metálicas de São Paulo
estão embasadas no sangue e no suor
dos governantes ou da massa trabalhadora?
O milagre econômico – o blefe – foi operado
pelas mãos refinadas do ministro ou pelas
palmas calejadas dos operários?
Mostrem-me, por favor, onde está o túmulo
do nordestino desconhecido...
Tantas construções,
Quantas interrogações...

Café

Meu III Plágio de Brecht

Que época é essa onde os sonhos devem
se ocultar para não se tornarem ridículos?
Que época é essa onde os rostos que
sorriem podem demonstrar insensibilidade?
Que época é essa onde comer um pedaço
de pão pode ser injustiça?
Que época é essa onde parar para
contemplar pode ser omissão?
Que época é essa onde você pode
ser denunciado por seus amigos?
Que época é essa onde falar de justiça
pode trazer a condenação?
Que época é essa onde falar de liberdade
pode gerar a prisão?
Que época é essa onde andar pelas ruas
é correr ao encontro da morte?
Que época é essa onde sobreviver
é um acaso?

Retirantes

Referência:

MALVEZZI, Roberto. Meu I plágio de Brecht / Meu II plágio de Brecht / Meu III plágio de Brecht. In: __________. Os sete pecados do capital: poeta, uma porção humana, cercada de fatos e de sonhos por todos os lados. São Paulo: Paulinas, 1982. p. 17, 54 e 57. (Grão de trigo; v. 1)

Nenhum comentário:

Postar um comentário