Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

quarta-feira, 8 de novembro de 2017

Pablo Neruda - Os Poetas Celestes

Neste poema, o poeta chileno enceta, em discurso desafiante, um repto a ideias de autores europeus, como o poeta de língua alemã Rainer Maria Rilke, o elaborador de conceitos como “beleza pura”, dirigindo-lhes indagações rumo ao compromisso com a História: “que fizestes ante o reinado da angústia,frente a este escuro ser humano,a esta pateada compostura,a esta cabeça submersa no esterco, a esta essência de ásperas vidas pisoteadas?”

E lá se vão as invectivas do poeta em direção a André Gide, Paul Valéry, André Breton e tantos outros autores europeus cultuados na América Latina, contemporaneamente à época em que as liberdades políticas eram confrangidas por ditadores instalados no poder, nos principais países do continente.

J.A.R. – H.C.

Pablo Neruda
(1904-1973)

Los Poetas Celestes

Qué hicisteis vosotros gidistas,
intelectualistas, rilkistas,
misterizantes, falsos brujos
existenciales, amapolas
surrealistas encendidas
en una tumba, europeizados
cadáveres de la moda,
pálidas lombrices del queso
capitalista, qué hicisteis
ante el reinado de la angustia,
frente a este oscuro ser humano,
a esta pateada compostura,
a esta cabeza sumergida
en el estiercol, a esta esencia
de ásperas vidas pisoteadas?

No hicisteis nada sino la fuga:
vendisteis hacinado detritus,
buscasteis cabellos celestes,
plantas cobardes, uñas rotas,
“Belleza pura”, “sortilegio”,
obra de pobres asustados
para evadir los ojos, para
enmarañar las delicadas
pupilas, para subsistir
con el plato de restos sucios
que os arrojaron los señores,
sin ver la piedra en agonía,
sin defender, sin conquistar,
más ciegos que las coronas
del cementerio, cuando cae
la lluvia sobre las inmóviles
flores podridas de las tumbas.


Les Champs-Élysées
(Antoine Blanchard: pintor francês)

Os Poetas Celestes

Que fizestes vós gidistas,
intelectualistas, rilkistas,
misterizantes, falsos bruxos
existenciais, papoulas
surrealistas acesas
numa tumba, europeizados
cadáveres da moda,
pálidas lombrigas do queijo
capitalista, que fizestes
ante o reinado da angústia,
frente a este escuro ser humano,
a esta pateada compostura,
a esta cabeça submersa
no esterco, a esta essência
de ásperas vidas pisoteadas?

Não fizestes nada senão a fuga:
vendestes detritus amontoado,
buscastes cabelos celestes,
solados covardes, unhas fendidas,
“Beleza pura”, “sortilégio”,
obra de pobres assustados
para evadir os olhos, para
emaranhar as delicadas
pupilas, para subsistir
com o prato de restos sujos
que os senhores vos lançaram,
sem ver a pedra em agonia,
sem defender, sem conquistar,
mais cegos que as coroas
do cemitério, quando cai
a chuva sobre as imóveis
flores pútridas das tumbas.

Referência:

NERUDA, Pablo. Los poetas celestes. In: __________. Selected poems of Pablo Neruda. A bilingual edition edited and translated by Ben Bellit: Spanish x English. Introduction by Luis Monguió. 10th printing. New York, NY: Grove Press Inc., 1977. p. 142.

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