Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

domingo, 12 de novembro de 2017

Augusto Meyer - Canção do Mundo Pueril

Eis aqui mais um poema que se debruça sobre a passagem do tempo e os impactos que a memória provoca sobre os sentimentos vivenciados por cada um que vê os seus dias avançarem muito além da estação folgazã da infância.

Julga o poeta que o sol fugiu das manhãs dos seus dias correntes, para os quais a metáfora da finitude sombria e melancólica se lhes aplica dadivosamente, a configurar um drama que o vate busca atenuar, implorando à mãe para que lhe devolva a luz dos tempos de outrora.

J.A.R. – H.C.

Augusto Meyer
(1902-1970)

Canção do Mundo Pueril

Uma nuvem passou.
Toda a casa mergulha
no halo negro da sombra,
na penumbra do outro mundo.
Luarizada, a janela da sala...

Chove cinza.

E o tapete agoniza
na penumbra do mundo.

Ninguém fala.
Brilha o vaso na mesa
e um pedaço do espelho.
Tenho medo...

Chove a sombra do mundo
sobre o ninho da sombra.

Oh a canção dos pomares!

Me dá o sol!
Dá-me a infância perdida
como um raio de sol!

A alegria subia
como aquele balão
que, uma tarde gloriosa,
fugiu da minha mão...

O relógio parou.

Arde o meu coração,
bate em meu coração
toda a angústia do mundo!

A rosa do tapete
É uma flor de penumbra.

– Mãe, eu quero o sol!

Em: “Giraluz” (1928)

Lembranças da Infância
(Andrea Banjac: artista sérvia)

Referência:

MEYER, Augusto. Canção do mundo pueril. In: __________. Poesias: 1922-1955. Rio de Janeiro: Livraria São José, 1957. p. 83-84.

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